As cidades, as escolas, os cinemas, os prédios públicos, enfim, a sociedade brasileira está apta a servir e incluir os deficientes visuais no seu dia-a-dia? No geral, a resposta é não. Às vezes, até a própria família não se mostra preparada para viver com um deficiente visual. Na novela América, da Rede Globo, a personagem Flor (vivida por Bruna Marquezine) não consegue integrar-se à sociedade em razão da superproteção de sua mãe que não a vê preparada para enfrentar o mundo.
Por que uma deficiência faz de alguém um cidadão diferente ou com menos direitos? Essa pergunta parece absurda, mas a ausência de projetos de acessibilidade para os deficientes mostra que ela, muitas vezes, é verdadeira.
A educadora Elizabet Dias de Sá conhece bem essa história. De uma família com oito irmãos, cinco deles, incluindo ela, cegos em razão de uma doença supostamente hereditária, ela enfrentou dificuldades desde a infância. “Nasci com baixa visão, usava óculos com lentes grossas e lupas. Tinha dificuldade para ler, escrever e enxergar à distância. Caminhava pisando em ovos, tropeçava com freqüência, caía e não conseguia distinguir pessoas e objetos a não ser bem de perto. Percebia cores fortes, mas não conseguia ver letras miúdas, lia com os olhos colados no papel e sentava grudada na televisão”, diz.
Coordenadora do Centro de Apoio Pedagógico às Pessoas com Deficiência Visual de Belo Horizonte, ela acredita que é preciso “promover mudanças estruturais para provocar mudanças de mentalidades e vice-versa”. E completa, “precisamos criar ambientes favoráveis e acolhedores que operem positivamente na formação de mentalidades, de valores e de princípios que incorporem as diferenças como condição natural do ser humano e não como deformação ou negatividade.”
Para Elizabet, é necessário que se trabalhe em cima das potencialidades dos indivíduos e não sobre suas incapacidades ou impedimentos. Ela mesma é um exemplo dessa atitude. Quando era estudante de magistério, trabalhava com crianças que tinham dificuldade de aprendizado. “Aquelas crianças não tinham deficiência. Elas aprendiam comigo o que não conseguiam aprender na escola. Elas lidavam bem com a minha dificuldade de enxergar e eu com a delas de aprender os conteúdos da escola”, fala.
Em relação à legislação, a educadora acredita que ela nunca é suficiente. “Numa sociedade democrática, os direitos vão se ampliando e ao conquistarmos determinados patamares, surgem novas necessidades, invenções e novas conquistas. Por outro lado, a legislação brasileira, neste aspecto, ainda guarda ranços de assistencialismo, uma vez que os direitos fundamentais ainda não foram devidamente assegurados para as pessoas que se encontram em condições de risco ou de vulnerabilidade social agravadas pela deficiência”, diz.
E, completa, “além disso, as leis brasileiras costumam ser ignoradas ou descumpridas. Se fossem cumpridas, a rigor, certamente o acesso e a permanência na escola e no mundo do trabalho bem como em outros setores da vida em sociedade para estas pessoas seriam mais satisfatórios.”
Fonte: Acessibilidade Brasil